Ciência sem Fronteiras: investimento em educação? Sim, só que não.

À parte todos os posts com assuntos irrelevantes relacionados à minha viagem iminente, venho hoje falar sobre uma coisa séria: afinal de contas, qual é o principal motivador do governo brasileiro ao distribuírem tantas bolsas para intercâmbio aos universitários? Será que é mesmo um investimento na educação ou é só mais uma tática populista do PT visando uma nova reeleição?

Antes de mais nada, longe de mim querer cuspir no prato em que estou comendo. Fato é que, mesmo que eu esteja dentre os milhares de alunos beneficiados com uma bolsa subsidiada por um órgão federal, ainda vejo muitos vieses entremeio a um processo longo, confuso, mas cheio de visibilidade, que não podem passar batidos à população em geral. 

Em uma rápida busca em qualquer site de pesquisa, veremos que o CSF é divulgado como sendo um grande investimento à educação. Sem dúvidas, é um dinheiro que está sendo dado a estudantes para que eles busquem conhecimento em universidades internacionais de renome, e acrescentem assim pontos importantes nos seus respectivos currículos e apliquem esse aprendizado no Brasil, ao voltarem. Isso se enquadra sim em investimento na educação, eu acho.

Porém investir uma grande quantia de dinheiro em uma pequena amostra de estudantes universitários para que eles estudem em uma universidade de melhor padrão é solução para alguma coisa? Hmmm... não, não é. 

Solução seria investir na educação de base, investir nas universidades brasileiras, investir de uma maneira em que todas as mentes sejam incentivadas igualmente e tenham subsidios para aplicar o conhecimento obtido em suas respectivas universidades. Transformar as nossas instituições de ensino superior em órgãos de padrão de excelência comparável aos internacionais. Mas vamos combinar: investimentos a longo prazo não angariam votos, não é verdade? Melhor mesmo mandar alguns milhares de intercambistas iludidos para o exterior e esperar que eles fiquem agradecidos o suficiente com a oportunidade e retorne o favor votando no PT na próxima eleição. Populismo, minha gente, é assim que funciona.

Desde o início da minha candidatura ao CSF tenho visto muitas falhas em edital e assistência que têm me deixado cada vez mais desapontada. Coisas que me deixam com a mais clara certeza de que, além de uma estratégia populista, o programa também é um disfarce para corrupção. 

Muitos de vocês talvez nem lembrem de um post que eu fiz há alguns meses (e que eu deletei por medo de reprimendas) apontando o disparate da Carta de Benefícios, que afirma com todas as letras que nossa bolsa é de £870, quando nós recebemos somente £420. Claro, gente, os demais £450 têm destino certo: a accommodation, que é paga diretamente à universidade. Mas sinto muito informar aos crentes, a mensalidade de muitas accommodations escolhidas pelas IES's para os alunos do CSF não chegam perto de 450 libras po mês. Castle Irwell, para onde eu vou, é um exemplo disso. Basta ir ao site da universidade para ver que, semanalmente, o custo de um quarto nas mesmas especificações do meu é de cerca de 65 libras semanais, ou £260 mensais. E o troco, cadê? Cadê, CNPq? Cadê, UUK? Cadê?! 

À ocasião, eu levantei todos esses argumentos em e-mails enviados ao SWB UK, CNPq e à University of Salford. Eu nunca recebi uma resposta sequer do CNPq. Salford me respondeu dizendo que não estava ao alcance deles este tipo de informação, mas entraram em contato diretamente com o UUK, apontando as minhas denúncias de possível corrupção. Recebi, por fim, uma ligação da Tânia Lima, responsável pelo UUK, diretamente de Londres, para me explicar tudo. 

Ela me repreendeu por fazer uma acusação tão grave sobre o Brasil a uma instituição britânica. Temeu pela má reputação que isso traria ao nosso país, e disse que - pasmem! - muitas vezes a universidade nem cobra a accommodation! Que é tudo pré-acertado em contrato com o Brasil, e que o pagamento é feito em grandes blocos. Resumindo, esses 450 pounds da accommodation são um valor declarado, não recebido pelos bolsistas e nem confirmadamente recebido em sua totalidade pela universidade. Qualquer um pode ter esse dinheiro, então? Hmmm, estranho.

Além disso, nós recebemos uma enorme quantia de dinheiro 5 meses antes da implementação oficial da bolsa, em reais, em uma conta brasileira, com a responsabilidade de realizar a conversão para GBP. Para início de conversa, nós já recebemos o dinheiro a uma cotação desatualizada (quando recebemos, após o pagamento complementar, a cotação estava a R$3,45, sendo que nós fomos pagos a R$3,35). Muita gente (eu, inclusive) ficou esperando a libra igualar à cotação recebida por nós, para realizar a conversão e não ter nenhum prejuízo. E a gente lá entende de economia para prever que a libra ia subir nessa velocidade ridícula? A libra hoje fechou o dia a uma cotação de R$3,78. Uma diferença de 43 centavos. Um rombo de aproximadamente mil libras. 

São 1000 libras do nosso sustento em um país estrangeiro que foram engolidos pela economia, pela hiper-valorização das moedas europeias frente a um Real que não suporta tanta pressão. São 1000 libras que eu, particularmente, e a grande maioria dos estudantes não tem a menor possibilidade de cobrir. 

E o que a gente faz se o CNPq se recusa a assumir o erro (o erro de realizar o pagamento em reais e não em libras, como haveria de ser)? Se não há, segundo eles, a menor possibilidade de nós recebermos um novo reajuste para diminuir o prejuízo? Eu não sei. 

Eu não sei!

Já sei o que muitos de vocês estão pensando: o governo paga dinheiro que sobra, nós ainda temos condições de sobreviver 3 meses com 1000 libras a menos. Eu sei, eu sei... ninguém aqui pretendia levar uma vida de marajá lá fora, acreditem em mim. Eu só acho que, a partir do momento que nós assinamos um contrato dizendo que receberemos X libras, leiam bem, libras, a partir do mês de setembro, e recebemos em vez disso uma quantidade em reais no mês de abril, sujeita a grandes oscilações de economia como ocorreu, nós temos sim todo o direito de reclamar.

E reclamamos sim, sem obter nenhum suporte!

Sim, estou sujeita a julgamentos por estar reclamando de barriga cheia. Eu vou ser sustentada por um ano na Inglaterra pelo governo federal, deveria estar agradecendo por isso, deveria votar na Dilma, deveria chamar a presidenta de dilmãe e ovacionar essa maravilhosa iniciativa. Já ouvi tudo isso, e vou ouvir de novo, e de novo, e de novo. 

Mas não. 

Venho aqui colocar minha cara a tapa e dizer: o Ciência Sem Fronteiras não é investimento em educação como eu gostaria de ver. O Ciência Sem Fronteiras não é o investimento de educação que o Brasil precisa! Até agora, eu só vi vieses e oportunidades infindas para a prática da corrupção que, apesar de não ser justamente generalizada dentre todos os funcionários federais, é fichinha batida no país do mensalão, do dinheiro na cueca, da rodada de pizza ao fim de cada CPI.

Então, eleitores, não usem esse programa como argumento para a escolha do seu voto!

Hipocrisia? Talvez. 

Mas, de boa, eu vou perder essa oportunidade por conta de uma crise de consciência assim? Nah, não.
Se eu não recebo o que eu mais quero, que é uma universidade federal de ponta aqui no Brasil (e não vou receber tão cedo), eu devo no mínimo abraçar a chance de receber conhecimento de uma universidade de ponta no exterior. 

Mas ainda acho que isso não é solução nenhuma para a educação do nosso país.